Sunday, June 03, 2007

Nos próximos vinte e cinco anos

"Perguntaram-me uma vez se eu saberia calcular o Brasil daqui a vinte e cinco anos. Nem daqui a vinte e cinco minutos, quanto mais vinte e cinco anos. Mas a impressão-desejo é de que num futuro não muito remoto talvez compreendamos que os movimentos caóticos atuais já eram os primeiros passos afinando-se e orquestrando-se para uma situação econômica mais digna de um homem, de uma mulher, de uma crianaça. E isso porque o povo já tem dado mostras de ter maior maturidade política do que a grande maioria dos políticos, e é quem um dia terminará liderando os líderes. Daqui a vinte e cinco anos o povo terá falado muito mais." Clarice Lispector em 16 de Setembro de 1967.
Quarenta anos depois de escritas estas palavras o cenário brasileiro de Clarice ficou longe de sua impressão-desejo. Os movimentos a que se referia reuniam jovens cheios de vontade de mudanças, cheios de garra para lutar pelo que acreditavam. Envolvidos em uma batalha política pelo país, independentemente de que lado estavam, cada um tinha um motivo e um sentido para agir como agiam. São alguns dos nossos líderes de hoje, nisso Clarice estava certa. Mas como mudou o cenário e os motivos é que é a questão. A sociedde se desenvolveu de uma forma diversa, e arrisco dizer, de uma forma perversa. Os líderes que temos hoje sabem o que a educação, a informação e a cultura podem fazer a um governo. Eles usaram destes artifícios para chegarem onde estão, mas junto nesta conquista, fecharam o cerco pra futuros contestadores. Os Universitários pela primeira vez em anos se reunirão e organizaram uma manifestação digna dos ouvidos do governo e do povo. Mas por quais motivos? Moradias estudantis, melhores condições para os professores, "autonomia universitária"? Enquanto isso o congresso aprovou o aumento de 28% dos próprios salários, enquanto isso o Presidente do Senado não explicou nada das inúmeras acusações, sem contar o vexame sobre o relacionamento extra-conjugal. Enquanto isso a Polícia Federal indicia mais e mais personalidades que gerem nosso país e Cpis e mais Cpis são instauradas, mas os universitários continuam ocupando a Reitoria por sua "autonomia" e moradias. A iniciativa é um sinal de que ainda há vida nesse país. Os motivos mostram que a maturidade política que Clarice acreditava estar se consolidando, sumiu de dentro de nós há muito tempo. A rádio Joven Pan tem mostrado em uma série de reportagens o nível da educação brasileira, onde crianças cursando a quarta série dizem que o Presidente do Brasil é Pedro Álvarez Cabral. Duda Mendonça não conseguiu comunicar Lula pra elas. A situação caótica não é só no Brasil, em muitos lugares do mundo a educação é falha, em muitos lugares a fome é regra de sobrevivência, a pobreza é rainha e os governantes vivem com muito mais dinheiro que seus salários. Minha intenção aqui não é jogar pedras no povo brasileiro, mas é chamar um pouco a atenção de alguns seres humanos, independente de sua nacionalidade, para que olhem pra dentro por um segundo. Olhem para si mesmos, porque olhar pro mundo é desesperdor mesmo. Olhando pra si, cada um entenda que tem responsabilidade sobre a pessoa que é, e que lutando para que seja alguém melhor, no sentido humano, o mundo passa a não ser tão assustador assim. E a pessoa do lado passa a ter uma importância, e todas as suas atitudes passam a não serem isoladas e egoístas, mas têm um motivo, um sentido. E então é podemos perceber que a vida é muito mais possível do que parece, e poderemos falar e agir muito mais, e o texto de Clarice pode voltar a ter validade.